sábado, 13 de março de 2010

Quaresma

1. O que é a Quaresma
Nós cristãos celebramos todo ano a festa da Páscoa: a morte e a ressurreição de Jesus e tamém a nossa. É a maior de todas as festas. A mais importante... Grande demais para ser preparada em apenas três dias ou uma semana. Por isso, estendemos a sua preparação para quarenta dias. Daí Quaresma, período de quarenta dias, que vai da quarta-feira de cinzas até a quinta-feira santa pela manhã.

Os textos litúrgicos que rezamos durante o tempo da Quaresma são belíssimos e nos conduzem ao verdadeiro espírito deste ?tempo favorável?. Poderia citar muitos mas o espaço do artigo não me permite. Cito portanto apenas o Prefácio da Quaresma V (Missal Romano, pág. 418) como síntese de toda esta riqueza:

?Na verdade, é justo e necessário, é nosso dever e salvação louvar-vos, Pai santo, rico em misericórdia, e bendizer vosso nome, enquanto caminhamos para a Páscoa, seguindo as pegadas de Jesus Cristo, vosso Filho e Senhor nosso, mestre e modelo da humanidade, reconciliada e pacificada no amor.

Vós reabris para a Igreja, durante a Quaresma, a estrada do Êxodo, para que ela, aos pés da montanha sagrada, humildemente toma consciência de sua vocação de povo da aliança. E, celebrando vossos louvores, escute vossa Palavra e experimente os vossos prodígios.

Por isso, olhando com alegria esses sinais de salvação, unidos aos anjos e aos santos, entoamos o vosso louvor, cantando a uma só voz:?

Podemos encontrar neste Prefácio todos os elementos que caracterizam não só a liturgia deste Tempo, mas especialmente a sua teologia, a sua espiritualidade e a sua pastoral. Voltamo-nos para Deus, ?Pai Santo, rico em misericórdia?; relembramos a grande experiência do Êxodo, da Aliança, da libertação e da nova terra; assumimos nossa atitude de povo peregrino, ouvintes da Palavra, povo amado e escolhido por Deus; nosso modelo é Cristo, cuja morte e ressurreição celebramos de forma mais intensa neste tempo. Enfim, a Quaresma é um ?sinal de salvação? ou, numa expressão usada num artigo de Dom Manoel João Francisco, ?sacramento anual de reconciliação?.

É indispensável que recuperamos também a Quaresma como o tempo ideal de fazer a preparação final dos catecúmenos que serão batizados, confirmados e receberão a Eucaristia na Vigília Pascal. O Ritual da Iniciação Cristã dos Adultos (RICA) lembra que ?o tempo da purificação e iluminação dos catecúmenos é normalmente a Quaresma. De fato, na liturgia e na catequese, pela comemoração ou preparação do Batismo e pela penitência, a Quaresma renova a comunidade dos fiéis juntamente com os catecúmenos e os dispõe para a celebração do mistério pascal, ao qual os sacramentos de iniciação associam cada um? (Introdução do RICA, n. 21). 2. Simbolos, ritos, gestos quaresmais

São vários os símbolos, as atitudes e iniciativas humanas e religiosas que acompanham e enriquecem o tempo da Quaresma, no qual, como em toda preparação, já saboreamos de certa maneira a festa da Páscoa que virá. Por exemplo:

* A cor roxa, as cinzas e a cruz lembram o caráter de penitência e conversão próprio deste tempo. Isto se manifesta também no visual do espaço celebrativo, sóbrio, despojado. * O jejum nos orienta a dar mais atenção à Palavra de Deus. A fome que sentimos (quando fazemos jejum) pode simbolizar e evocar a fome que temos da Palavra de Deus. É tempo forte, portanto, de escuta da Palavra, pois através dela vamos conhecer os desejos de Deus e praticar a sua vontade. * Ajudados pela Campanha da Fraternidade, intensificamos a prática da caridade, procurando corrigir e aperfeiçoar, à luz da Palavra de Deus, nosso jeito como tratamos as pessoas e com elas nos relacionamos, sobretudo os mais pobres e sofredores, e como procuramos ajudá-los a viver com dignidade. Nesta ano de 2010, temos uma motivação ainda maior por ser uma Campanha da Fraternidade Ecumênica. * Nesse tempo forte da vida da Igreja intensificamos nossa vida de oração, na forma de súplicas, pedidos de perdão, intercessão, agradecimento, compromissos de fé, melhor participação na comunidade etc. É um tempo próprio para, nas comunidades, a gente participar de alguma celebração penitencial (individual ou comunitária). Sobre estas três atitudes ? jejum, esmola e oração ? os Santos Padres fazem muitas referências. Recordemos algumas: ?O que a oração pede, o jejum alcança e a misericórdia recebe. Oração, misericórdia, jejum: três coisas que são uma só e se vivificam reciprocamente? (São Pedro Crisólogo). ?Não tem mérito nenhum negar alimento ao corpo se no coração não se renuncia à injustiça e se a língua não se abstém da calúnia? (São Leão Magno). ?A esmola só será autêntica se à ajuda material estiver unido o perdão das ofensas? (Santo Agostinho). * Podemos expressar nossa vontade de participar da caminhada sofrida de Jesus (vítima da violência, de ontem e de hoje), participando de procissões (de ramos, do encontro, do Senhor morto etc.), Via-Sacras, círculos bíblicos etc. * Expressamos o ?clima? próprio deste tempo forte da vida da Igreja também através da música e do canto. Há uma música própria e cantos que caracterizam este tempo, além do hino da CF . O Hinário 2 da CNBB apresenta também um bom repertório de músicas litúrgicas quaresmais. Na introdução do Hinário 2 lemos: ?Cantar a Quaresma é, antes de tudo, cantar a dor que se sente pelo pecado do mundo, que, em todos os tempos e de tantas maneiras, crucifica os filhos de Deus e prolonga, assim, a Paixão de Cristo. O canto da quaresma nos inspira e anima a assumir, com mais garra do que nunca, a Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. (...) Pela participação em seus sofrimentos, isto é, ?obedientes ao Pai e comprometidos com os irmãos até o fim? (cf. Jo 13,1), ?cheguemos à glória da sua ressurreição? (cf. Fl 3, 10-11)?. Para ajudar nesta vivência, é aconselhável também que se evite na Quaresma o toque de instrumentos musicais. Também não cantamos o ?glória? e o ?aleluia?.

3. Lembretes práticos para as equipes de liturgia e de celebração

* O espaço litúrgico, despojado, sóbrio e ?vazio? nos ajuda a esvaziar o coração para preenchê-lo com a Palavra, que é luz para nossos passos e que nos converte. * Momentos de silêncio, principalmente entre as leituras e após a homilia, são importantes. * Um sinal permanente no espaço litúrgico, como um tecido roxo em forma de faixa na mesa da Palavra ou como detalhe na mesa eucarística (sem ?tampar? ou esconder o altar), ajudará na experiência quaresmal. Não colocar o cartaz da CF em frente ao altar ou ambão, mas num outro local, de preferência na entrada da igreja, bem visível para a comunidade. * A cruz, pela qual fomos marcados no Batismo, deve ser destacada. Ela lembra que somos discípulos e discípulas de Jesus, que superou o fracasso humano da cruz com um amor que vence a morte. * A comunidade pode fazer maior experiência da misericórdia de Deus através do sacramento da Reconciliação, de celebrações penitenciais e também de retiros.

4. Semana Santa e Tríduo Pascal: a conclusão da quaresma

Existe um jeito, um lugar, um momento muito especial no qual aprenderemos a ?viver a semana santa?. É o que nos aponta o saudoso Papa Paulo VI: ?Se há uma liturgia que deveria encontrar-nos todos juntos, atentos, solícitos e unidos para uma participação plena, digna, piedosa e amorosa, esta é a liturgia da grande semana. Por um motivo claro e profundo: o Mistério Pascal, que encontra na Semana Santa a sua mais alta e comovida celebração, não é simplesmente um momento do Ano Litúrgico: ele é a fonte de todas as outras celebrações do próprio Ano Litúrgico, porque todas se referem ao mistério da nossa redenção, isto é, ao Mistério Pascal?.

?Viver a semana santa? significa fazermos memória destas ações maravilhosas de Deus. Mais, saber que estamos ?re-vivendo? todos estes fatos. ?De geração em geração, cada um de nós é obrigado a ver-se a si próprio, com os olhos penetrantes da fé, como tendo ele mesmo estado lá no Calvário, na primeira sexta-feira santa, e diante do sepulcro vazio, na manhã da ressurreição. Hoje, todos nós, aqui reunidos para celebrar a eucaristia, estávamos lá, prontos a morrer na morte de Cristo e a ressuscitar em sua ressurreição. Será exatamente nossa comunhão com o corpo sacramental do verdadeiro Cordeiro que nos tornará realmente presentes àquele eterno presente.?

Pe. Carlos Gustavo Haas


fonte: http://www.diocese-sjc.org.br/